segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Quarenta anos de formado. Já?

No dia 13 de dezembro de 1975, numa enorme festa no Ginásio Gigantinho, do Internacional, eu e mais uns 300 formandos do curso de engenharia da UFRGS recebemos o nosso diploma. É interessante notar que no dia seguinte, no Estádio ao lado deste ginásio, o Inter venceu o Cruzeiro em um jogo épico, e conquistou seu primeiro campeonato brasileiro de futebol, mas meu coração gremista prefere ignorar esta coincidência histórica.
Hoje, quarenta anos depois, como está o Brasil, e a engenharia brasileira? É claro que é possível escrever vários artigos e talvez até um livro sobre o assunto, mas vou tentar focar em alguns poucos pontos, para evitar que o provável leitor desista só de olhar.
1. O perfil do engenheiro; fiz parte da última geração que ainda utilizou réguas de cálculo. Conheci uma calculadora de quatro operações quando já estava no terceiro ano da faculdade, e o nosso conceito de “computador” ainda era o monstrengo chamado “IBM 1130”. O avanço da informática trouxe, na minha visão, duas consequências importantes, uma ruim e uma boa;
a) Perda da sensibilidade matemática; sem querer puxar a brasa para o meu assado, entendo que a falta de ferramentas nos obrigava a entender melhor os problemas e ter uma boa noção sobre ordem de grandeza (tínhamos que trabalhar sempre com números redondos). Hoje vejo engenheiros que são apenas “pilotos de planilha”; colocam os dados e registram as respostas, automaticamente. Veja bem, não estou dizendo que são menos inteligentes do que os antigos; apenas ficaram preguiçosos, nunca precisaram fazer uma conta de cabeça. E isto faz falta;
b) Desenvolvimento de outras qualidades; como passávamos a maior parte do tempo envolvidos com contas e números a parte “humana” dos engenheiros da minha época era uma verdadeira tragédia (veja bem; estou falando em termos médios). Assim, quando ele evoluía para posições gerenciais, costumava se portar como um ogro. Hoje, a parte “braçal” da matemática é feita por computadores, e os engenheiros (em média, repito) estão muito mais habilitados a lidar com questionamentos fora da sua área de atuação. Isto é ótimo.
2. O Brasil mudou só um pouquinho; cursei a faculdade no momento mais forte e repressivo da ditadura militar, no início dos anos 70. Também vivi o “milagre brasileiro”, na época. Depois de formado vi, com satisfação, a evolução para um estado democrático, mas também sei que o maior fator para o fim da ditadura foi a decadência econômica do modelo que nos levou ao “milagre”. Hoje vejo com tristeza que a situação se repete; o PT copiou exatamente o que deu errado no modelo militar e estamos diante de uma nova crise pós-“milagre”. Sem entrar muito em detalhe, o que eu entendo disto tudo é que nos faltou uma evolução cultural; estamos em um estado democrático, e espero que ninguém pense em sair dele, mas o fato é que não temos ainda um debate político qualificado (continuamos com briguinhas ideológicas, tipo neo-liberais x bolivarianos, assim como antigamente eram comunistas x reacionários, enquanto o mundo civilizado já passou deste estágio há tempos). A própria estrutura de poder não evoluiu; o Presidente da República, embora agora seja eleito por voto popular, mantém poderes quase ditatoriais, o que pode ser visto no caso da Petrobras, onde ficou claro que Presidente, Diretores e Conselho de Administração da empresa nunca tiveram liberdade para discordar do Palácio do Planalto; quem não dançar conforme a música, vai embora. Resumindo, não somos mais uma ditadura, mas ainda estamos longe de uma cultura democrática. E, infelizmente, isto faz muita diferença, ainda.
3. As mulheres arrombaram a porta; esta talvez seja a mudança cultural mais significativa e interessante de todas. Sim, eu fui criado em uma sociedade em que as “moças de família” casavam virgens e eram treinadas para o papel de esposas e donas de casa. “O avental todo sujo de ovo” citado na melosa canção, era o diploma de “rainha do lar”, a mãe e esposa exemplar e submissa. Fico impressionado em ver como as coisas mudaram tanto em tão pouco tempo. Para ter uma ideia de qual era o papel da mulher na sociedade de então, digo que, dos 400 alunos aprovados no vestibular de engenharia da UFRGS em 1971, apenas 20 (ou seja, 5%), eram mulheres. E, se a memória não me falha, este número foi um recorde para os padrões da época. Impressionante como, em poucas décadas, chegamos ao ponto de ter uma mulher ocupando a Presidência da República (embora não seja, seguramente, o mais brilhante exemplar da espécie, mas tudo bem). É claro que ainda existem bolsões de resistência machista, afinal quarenta anos é muito pouca coisa em termos de história, mas esta foi uma evolução espetacular. Uma vitória para as mulheres, e para toda a sociedade.
4. Perspectivas futuras; este é outro ponto onde o mundo mudou muito. Em 1975 a expectativa de vida útil do ser humano era bem menor. Minha geração foi a que largou o cigarro (eu, graças a Deus e a uma bronquite asmática na infância, nunca tive nem a curiosidade de experimentar), e também começou a dar importância a uma alimentação saudável e exercícios físicos. A famosa música dos Beatles colocava a idade de 64 anos como a porta do asilo (“will you still need me, will you still feed me, when I’m 64?”). Pois bem, eu e meus colegas estamos hoje nesta faixa (eu completo os 64 em 11 de março próximo) sem necessidade de que alguém nos alimente, e com a certeza de que ainda precisam da gente. E, entendo eu, com a possibilidade de assumir o protagonismo na maior mudança da história do Brasil. Porque estamos assistindo a cenas inéditas; empresários, diretores de empresas estatais e privadas e até políticos de primeiro escalão estão indo em cana. Agora, para que isto traga resultados práticos, é preciso que não fiquemos na posição de meros torcedores; é hora de entrar em campo, exigindo que novas bases sejam estabelecidas. Sai de campo o compadrismo, as capitanias hereditárias, o “jeitinho brasileiro”, o autoritarismo; entram a meritocracia, a competitividade, a eficiência e a educação de qualidade. E nós, engenheiros, somos importantes para que este jogo vire. Afinal, se tem alguém que entende de projetos, somos nós.
Quem viver, verá.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Tiririca presidente? Por que não?

Da série "um País não pode ser maior do que os valores de seu povo";
Soube hoje que o deputado Tiririca (não sei nem o nome, nem o sobrenome dele) é o quinto na linha sucessória para ocupar a Presidência da República, caso se confirme o "impeachment" da "Presidenta" (argh....) Dilma. O engraçado é que já vi e ouvi muita gente boa dizendo que o Tiririca é um deputado exemplar, porque não falta às sessões e não é corrupto. Acrescento, por minha conta, que, até onde estou informado, ele não bate em mulher, paga seus impostos, etc...
Com todo o respeito, este é um currículo mínimo para qualquer função, mas para citar alguém como "exemplar" na sua área de atuação, entendo que o sujeito tem que ter a chamada "competência específica".
Considero que Tiririca pode ser chamado de "humorista exemplar" (quase falei "palhaço exemplar" mas, infelizmente, este termo pode ter outras conotações) porque, além das qualidades acima, também é um cara muito engraçado, capaz de fazer a gente rir.
Agora, para citá-lo como "deputado exemplar", gostaria de saber quais foram os projetos de lei que apresentou, qual seu posicionamento diante das grandes questões nacionais, e coisas assim. E isto ninguém sabe - provavelmente, nem ele.
Resumindo; um País que espera tão pouco de seus homens públicos, não vai chegar muito longe, mesmo. E a culpa não é do Tiririca; é de quem votou nele "só de zueira".
Pensem nisto...

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Ser canalha no futebol é normal?

Da longa série “no fundo, somos todos canalhas”;
O campeonato brasileiro de futebol chega à sua última rodada, e nos apresenta uma situação que não é inédita, mas faz pensar. O Vasco, presidido pelo neandertal Eurico Miranda, depende do resultado do jogo do Fluminense para não cair. E justamente pelo comportamento troglodita do citado diretor, vejo vários amigos tricolores cogitando a “entrega” do jogo para o Figueirense, o que seria a pá de cal para as pretensões do Vasco de permanecer na série A.
Veja bem, ninguém está falando que o time, por já não disputar nada, vai jogar desmotivado e, provavelmente, desfalcado; o papo é “entregar o jogo”. E depois curtir, feliz, com a desgraça dos cruzmaltinos.
Esta proposta ajuda muito a entender os valores e crenças brasileiros e, por tabela, explicar o nosso alto índice de corrupção e falcatruas. Afinal, se analisarmos sob o ponto de vista de negócio, é muito melhor para os tricolores ter o Vasco na série A do que o Figueirense; são dois clássicos garantidos em 2016, e uma viagem a menos, é só fazer as contas. O próprio futebol do Rio se fortalece, na hora de reivindicar alguma coisa, se todos os seus times estiverem na divisão de elite. Além disto, este tipo de atitude acaba por desvalorizar o futebol como um todo; quem quer assistir a um jogo de cartas marcadas?
Mas o mais importante é o aspecto ético e moral. Afinal, se o torcedor do Fluminense considera que entregar um jogo é coisa normal, então não pode reclamar das safadezas e falcatruas de políticos e empresários. E o mesmo se aplica a torcedores de outros clubes (inclusive o meu Grêmio, que fez coisa parecida no jogo com o Flamengo em 2009). Resumindo; se a gente apoia este tipo de sacanagem, então não temos moral para sair na rua reclamando de corrupção e desvio de verbas.
Enfim, ainda temos um longo caminho a percorrer no campo da ética e da disciplina. E não adianta rotular os políticos como “canalhas”; eles são apenas o reflexo de nós todos, a sociedade dos pequenos canalhas otários. A mudança cultural é possível, mas tem que começar dentro de cada um. E enquanto nós brasileiros escolhemos continuar com estas atitudes pequenas, do outro lado do Oceano alguém grita; Gooool da Alemanha!