terça-feira, 30 de dezembro de 2014

MENSAGEM DE ANO NOVO – CONHECIMENTO X SABEDORIA

Esta é mais uma daquelas deliciosas historinhas que ninguém sabe exatamente de onde veio, mas que fazem a alegria de professores, palestrantes e contadores de “causos” que nem eu.
Dizem que um dia um aluno muito aplicado perguntou a um de seus mestres se já podia se considerar um sábio, uma vez que, nos últimos anos, tinha se dedicado exaustivamente aos estudos, concluindo de forma brilhante diversos cursos, além de ter lido todos os livros importantes.
O mestre sorriu e disse; gafanhoto, meu filho, hoje podes dizer que és um homem com muito conhecimento, mas ainda estás longe de ser um sábio.
Decepcionado, o discípulo perguntou; Mestre, mas afinal qual é a diferença entre conhecimento e sabedoria?
O velho se concentrou um pouco e falou; há uma bela cachoeira que fica a cerca de uma hora de caminhada daqui. Amanhã bem cedo vamos juntos meditar lá em busca desta resposta. Só que, para que a caminhada seja mais sofrida e nos faça merecedores do aprendizado, vamos colocar vinte grãos de feijão em cada um dos nossos sapatos. Fechado? (acho que, nas horas vagas, ele assistia o “Caldeirão do Huck”).
O discípulo topou e, no dia seguinte, foram os dois para a terrível caminhada. Depois de alguns minutos, o jovem mal conseguia disfarçar a dor que os feijões estavam causando; já o mestre, embora muito mais velho, seguia impávido e sorridente. Ao chegarem à cachoeira, o aluno tirou os sapatos, exibindo os pés machucados e sangrando, enquanto o professor continuava com seu sorriso enigmático. E então ele falou;
- Gafanhoto, meu filho, sabes porque não estou sentindo dor?
O jovem tentou arriscar uma resposta;
- Porque és um santo homem, porque a meditação fez com que vencesses a dor, porque te elevaste espiritualmente?
O mestre rebateu de primeira;
- Não, sua anta, é porque eu cozinhei os feijões!
E mostrou seus pés cobertos por uma gosma escura e mal cheirosa, com aspecto de feijoada que ficou dois dias fora da geladeira, mas sem nenhum arranhão.
A conclusão desta maravilhosa história é simples; o conhecimento teórico é muito importante, mas o sucesso na vida real exige muito mais que isto. Esta tese se aplica ao gerenciamento de projetos e a todos os campos do conhecimento humano. O fracasso, em termos de resultados, dos projetos brasileiros nos últimos anos, contrastando com o aumento exponencial no número de profissionais certificados, cursos de pós-graduação na área, enfim, de toda a movimentação que vemos em torno do tema “gerenciamento de projetos” é uma prova disto. Já decoramos todas as receitas infalíveis para o sucesso, mas na prática o que continuamos vendo são prazos atrasadíssimos, orçamentos estourados e escopos não cumpridos.
A minha interpretação é que temos muita gente propondo fórmulas e metodologias maravilhosas, muita tese, muito blá-blá-blá, mas na hora de meter a mão na panela e cozinhar os feijões, continuamos devendo. E advirto mais uma vez; se os resultados práticos não aparecerem, toda esta história de PMI, PMP, IPMA, PRINCE2, CANVAS e mais não sei o que, vai ser enterrada na vala comum das experiências fracassadas. Tenho certeza que nenhum de nós quer que isto aconteça...
Que 2015 seja o ano da sabedoria!

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

2014 – O ANO EM QUE O PROFESSOR KEATING ME ABANDONOU

No início dos anos 90 assisti a um filme que, de certa forma, mudou a minha vida; Sociedade dos Poetas Mortos. Se você não viu, vai entender muito pouco deste texto, mas pode aproveitar os feriados de Natal e final de ano para se dar o prazer de ver o filme, que está “em cartaz permanente” no YouTube (santa pirataria, Batman!).
Resumindo a história, um professor muito pouco convencional chamado John Keating começa a dar aulas de língua inglesa em um dos mais conservadores colégios dos Estados Unidos. Com bom humor e sabedoria ele leva aos alunos uma mensagem totalmente diversa da caretice da escola, mostrando que eles têm que viver com intensidade e paixão, mesmo que isto custe pequenas indisciplinas tais como arrancar páginas de um livro texto e otras cositas mas. Obviamente este comportamento entra em rota de colisão com os valores da escola, e este confronto atinge seu apogeu quando um aluno chamado Neil Perry, inspirado pelas palavras do professor “porra louca” decide que sua vocação é o palco; ele brilha na peça de fim de ano da escola como ator principal mas, no mesmo dia, seu pai, um militar “linha dura” que exige que o rapaz siga a carreira de toda a linhagem masculina da família, o retira à força da escola, com o objetivo de matriculá-lo em uma academia militar. Em casa, à noite, o rapaz não aguenta a frustração e se suicida. A corda, obviamente, rompe do lado mais fraco, o professor Keating é considerado responsável pela tragédia e demitido.
Além da abordagem muito interessante sobre o conflito entre o novo e o ultrapassado, e o nível de choque que isto pode causar, o filme se tornou antológico para mim pela interpretação de Robin Willians, na pele do professor Keating. Minha identificação com o personagem foi imediata, e até hoje tento ser algo parecido com ele em todos os lugares onde dou aula. Mais de uma vez procurei rever vídeos de algumas cenas do filme, especialmente a primeira aula dele, onde ensina o significado da expressão latina “Carpe Diem” (pode procurar no YouTube que também está lá, vale a pena).
Por tudo isto o suicídio do ator, em agosto deste ano, chocou-me profundamente. A repercussão da notícia no Brasil foi pequena porque, poucas horas depois, tivemos o acidente de avião que matou Eduardo Campos, e este assunto, obviamente, ocupou toda a mídia disponível. Mas eu me senti órfão. Robin tinha a mesma idade que eu, e, obviamente, morreu sem saber como foi importante para a minha vida. A coincidência entre o suicídio do aluno, na ficção, e o do mestre, na vida real, me fez refletir muito sobre a insensatez disto tudo.
“Make your lives extraordinary!” dizia o professor Keating. Aproveitem o dia; não deixem que suas vidas passem sem sentido. Robin Willians viveu uma vida extraordinária; mas nem assim escapou da depressão. Só posso ser grato a ele pelo que me deu, sem saber, e me confessar triste e perdido por este desfecho inesperado. A vida e suas contradições, etc...
Minha única conclusão sobre tudo isto é que a vida é uma merda. Eu sei que é chato falar uma coisa destas logo nesta época do ano, mas é o que sinto olhando para 2014. Talvez meu humor esteja abalado pelos 7x1, pelos escândalos da Petrobras, pelo mau desempenho do Grêmio... mas posso garantir que é um sentimento genuíno.
Antes que eu me esqueça, feliz 2015 prá vocês.

domingo, 14 de dezembro de 2014

PORQUE EU NÃO SUPORTO O TAL DE “POLITICAMENTE CORRETO”

Sou um grande admirador de Nelson Mandela, e o considero exemplo de como um líder justo e carismático é capaz de implantar mudanças mesmo em condições extremamente adversas. Depois da morte dele todo mundo concorda comigo, mas não era bem assim há uns oito anos atrás, quando aconteceu o “causo” que vou contar agora. Eu estava ministrando uma aula no MBA de gerenciamento de projetos da FGV-SP, e citei Mandela como um exemplo de líder transformador. Na turma havia três angolanos, um rapaz e duas moças. E uma delas me interrompeu e disse que Mandela não era tudo aquilo que eu estava dizendo.
Eu adoro quando alunos me interrompem e, principalmente, quando me contestam, porque sou democrata até o fundo da alma e acredito que a melhor forma de aprender e ensinar é através da discussão educada. Só que não foi difícil perceber que a mocinha estava com sangue nos olhos; ela via Mandela como um traidor dos negros, porque admitia ter brancos em sua equipe e procurava apaziguar os ressentimentos do passado. Ela achava que os brancos tinham que pagar por tudo o que tinham feito, e a posição conciliadora dele era vista por ela como frouxidão e falta de caráter. Percebi logo que o radicalismo dela impedia qualquer tentativa de debate inteligente, e antes que ela apelasse para um golpe baixo do tipo “você é branco, por isto não tem autoridade para discutir a questão dos negros”, dei um jeito de fechar logo a discussão e mudar de assunto. O interessante é que os outros dois angolanos, também negros, mesmo permanecendo calados durante toda a conversa deixaram claro, por gestos e expressões faciais, que não concordavam com as teses dela.
Lembrei este episódio ontem, quando vi a publicação do relatório do grupo que, pomposamente, se intitula “Comissão da Verdade”, com propostas de julgamento e punição para gente que já morreu e otras cositas mas. E a memória veio porque, na África do Sul, tivemos coisa semelhante, só que Mandela, como líder do projeto, fez questão de ouvir os dois lados. Desta forma, criou-se espaço para arrependimentos do tipo “eu fiz isto e aquilo porque, na época, acreditava que isto era o melhor para o meu país. Peço desculpas às vítimas e seus familiares”. Ou seja, houve um movimento no sentido de unir o que estava quebrado. No Brasil, como o poder apenas mudou de mãos, hoje ninguém pode contestar as vítimas de perseguição, assim como, na época, ninguém podia contestar os ditadores.
A pergunta que eu faço é; como alguém espera mudar alguma coisa com este tipo de atitude? Continuamos no ódio, só mudou o nome de quem bate e de quem apanha. Se pensarmos bem, toda esta ridícula praga do “politicamente correto” está baseada neste princípio; eles não querem direitos iguais para todos os que historicamente foram perseguidos, como negros, índios e homossexuais, mas sim revanche. Como a minha aluna rebelde, eles querem ver sangue; agora é a nossa vez! Olho por olho, dente por dente.
Recordando a atitude de gente que realmente mudou a história, como Jesus Cristo, Gandhi e Martin Luther King, por exemplo, vemos que a visão deles era sempre conciliadora, como a de Mandela. Quem conhece um mínimo sobre a Bíblia sabe que a diferença entre o Antigo Testamento e o Novo, que é o de Jesus, é justamente a introdução do perdão nas relações humanas. Em lugar da lei de Talião, cujo enunciado coloquei acima, Jesus propõe que se desculpe o irmão, não apenas uma vez, mas sempre. O sonho de Martin Luther King não era ver os negros dominando os brancos, mas todos vivendo como irmãos. Mandela seguiu esta linha.
A história nos mostra que uma sociedade só evolui a partir de propostas novas e discussões inteligentes. Resumir tudo a guerras santas tipo brancos x negros, homos x heteros, petralhas x coxinhas, não leva a nada. Sou contra a discriminação dos homossexuais, mas considero absurdo saber que um grupo de ativistas desta causa sugeriu um processo por homofobia contra o genial Maurício de Souza, apenas porque ele se recusou a colocar um personagem gay na turma da Mônica; menos, pessoal, muito menos. A historinha é dele, ele faz o que quiser. Na mesma linha, já teve gente querendo proibir Monteiro Lobato nas escolas porque descobriram uma frase que teria uma suposta conotação racista num de seus livros. Isto é doença, Lobato não só é um dos maiores escritores da língua portuguesa como um cidadão exemplar, um brasileiro cuja trajetória só nos orgulha (e quem trabalhou na área do petróleo, como é o meu caso, sabe muito bem disto).
Resumindo; Mandela, com sua visão de igualdade entre os seres humanos, conseguiu implantar avanços históricos em um país marcado, durante muito tempo, pelo ódio e segregação. No Brasil, infelizmente, os que se diziam arautos da mudança a cada dia se parecem mais com seus antecessores. Seguramente, o caminho do progresso não é este.

domingo, 9 de novembro de 2014

Pontos corridos x mata-mata – amor e paixão

Poucas discussões me parecem tão sem sentido como esta entre o campeonato de pontos corridos e o mata-mata. As emoções fortíssimas proporcionadas pela fase semifinal da Copa do Brasil deste ano fizeram com que muitos pensassem em ressuscitar o zumbi do campeonato brasileiro com finais eliminatórias, como era até 2002.
Pessoal; muita calma nesta hora. Ninguém discute que o mata-mata é muito mais emocionante, mas é preciso entender (se é que alguém ainda não entendeu) que este tipo de disputa só é boa para os clubes que sobrevivem até as finais. Neste momento, por exemplo, só os torcedores mineiros possuem um real interesse pela final da Copa do Brasil; os demais acompanham sem paixão, apenas por gostar de futebol. Já o “monótono” campeonato brasileiro ainda promete seis rodadas com diversos jogos decisivos envolvendo praticamente todos os vinte times da disputa. Ou seja; do ponto de vista financeiro, o campeonato de pontos corridos é melhor prá todo mundo, porque permite que o clube planeje a sua temporada até o final. Se os dirigentes são incompetentes e não planejam, o problema seguramente não é da fórmula.
Numa comparação poética, eu diria que o campeonato de pontos corridos é como o amor, e o mata-mata é a paixão. Amor é investimento de longo prazo, torna a vida mais sólida e feliz; a paixão é cega, e pode levar à ruína, mas enquanto dura, é capaz de proporcionar emoções inesquecíveis. O equilíbrio entre as duas coisas faz a vida completa e feliz, e quem acha que pode viver só de paixão, acaba sempre muito mal. Desta forma, entendo que a existência de um campeonato de pontos corridos e um mata-mata, conforme temos hoje, é a solução correta.
Aliás, não é por outra razão que os países europeus, onde temos os campeonatos mais organizados e rentáveis do mundo, usam esta fórmula com sucesso há muito tempo; um campeonato de pontos corridos e uma copa em fases eliminatórias. A emoção desenfreada dos grandes jogos eliminatórios, em paralelo com a solidez de uma temporada rentável para todos, que premia ao final o mais eficiente ao longo do ano. Simples assim.
O resto é invencionice de quem acha que brasileiro é mais “ixperto” que os outros.

sábado, 4 de outubro de 2014

SOBRE O RIDICULO DAS COTAS. DE NOVO

Todos os fanáticos por futebol do Brasil, entre os quais orgulhosamente me incluo, sabem que a seleção brasileira vai realizar um jogo amistoso contra a Argentina nos próximos dias. Como não existe jogo amistoso entre Brasil e Argentina, o clássico desperta interesse acima do normal. Nesta semana o Brasil teve duas baixas importantes, com as lesões do goleiro Jefferson e do meio-campo Ramirez. Para os seus lugares, o técnico Dunga convocou, respectivamente, o gremista Marcelo Grohe e o são-paulino Souza. E é aí que o chato do blogueiro aqui resolve meter a sua colher torta, como diria a minha avó lá de Santa Maria.
Para quem não se ligou no detalhe, os dois lesionados são negros, e os dois substitutos, brancos. Graças a Deus a doença do politicamente correto e seu terrível efeito colateral, as cotas raciais, ainda não chegaram à escalação da seleção brasileira de futebol. Já pensaram se as mentes doentias que andam dirigindo este país resolvessem que Jefferson só poderia ser substituído por outro goleiro negro (perdão, afrodescendente)? Felizmente Dunga não precisa passar por isto, pelo menos por enquanto. A sorte dele é que ninguém lê este blog, mesmo.
Falo isto para bater, mais uma vez, na mesma tecla que já me levou a colocar aqui outro post (ver; www.causosdoherve.blogspot.com.br/2010/11/e-la-vem-eles-com-as-cotas-de-novo.html); a única cota admissível em um país que quer crescer e chegar ao primeiro mundo é a de 100% das vagas para pessoas competentes. E o esporte nos dá uma bela lição disto; quando se trata de escolher os melhores jogadores, ninguém está preocupado se o cara é branco, preto, amarelo ou verde. A seleção alemã campeã do mundo é um exemplo belíssimo; num time de craques, que hoje é o grande orgulho de uma nação marcada até um passado recente pela xenofobia e intolerância racial, há lugar para o negro Boateng, os turcos Khedira e Ozil, os polacos Klose e Podolski, ao lado dos caucasianos Neuer, Schweinsteiger, Thomas Muller e outros. Tudo junto e misturado, como deve ser.
Resumindo; deixem a meritocracia fluir, e teremos sempre os melhores profissionais trabalhando. E entre estes melhores, naturalmente, haverá gente de todas as raças, religiões, opções sexuais, etc... Criar cotas é o melhor caminho para mediocrizar e depois desintegrar uma sociedade. O futebol prova isto.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

DE ARANHAS, MACACOS E VEADOS – UMA REFLEXÃO SOBRE A IRRACIONALIDADE HUMANA

Existe uma frase, de autor desconhecido, que me agrada muito. Ela diz que os ingleses bem educados inventaram o tênis; os mal educados, o futebol. E o fato do futebol ser muito mais popular que o tênis prova que os mal educados são a maioria absoluta no mundo.
Sou gremista e fanático por futebol desde que me entendo por gente, e tenho sérias dúvidas sobre pessoas que me dizem que gostam de futebol, mas não têm time preferido. Não acredito que isto seja possível; a paixão tem que ter um objeto. E sempre achei que a parte interessante do futebol era justamente a malcriação que ele permite; na arquibancada você xinga, berra, enfim, solta todo aquele lado “baixaria” que todo o ser humano normal tem. Quem torce não precisa de terapia, dizia um amigo dos meus tempos de gremista de arquibancada, no saudoso Estádio Olímpico. Nada mais verdadeiro.
Recordei tudo isto em função do episódio recente envolvendo a torcida do Grêmio e o goleiro Aranha, do Santos. Em primeiro lugar, devo dizer que jamais defenderei a “Geral do Grêmio”, nem qualquer torcida organizada de qualquer time; entendo que estes lugares viraram antros de marginais, torcedores profissionais, que só querem saber de dinheiro e favorecimentos políticos, colocando seus interesses pessoais muito acima do futebol ou do clube. Alias, podemos dizer que, de certa forma, este microcosmo reflete o que temos de pior na sociedade brasileira como um todo, mas isto fica para um próximo post.
O que eu acho importante nisto tudo é; o racismo é uma praga, sem dúvida, mas será que o “politicamente correto” não é uma praga pior? É claro que chamar um ser humano de “macaco” é inadmissível, mas será que é caso de prisão perpétua, ou pena de morte? Lembro que há muito pouco tempo estive no Maracanã assistindo Alemanha x França, e cantei, junto com a multidão, a musiquinha que terminava com “Maradona cheirador”; além disto, já xinguei a mãe de vários jogadores, além de questionar a masculinidade de árbitros e adversários. Isto é bonito? Claro que não. Eu me envergonharia de ver isto na TV? Obviamente. Então vamos acabar com isto? Desculpem o mau jeito, mas acho que aí é melhor acabar com o futebol, e vamos todos brincar de Barbie e fazer terapia depois.
O mais triste nestes casos é que o tratamento dado pela mídia é o pior possível, sempre levando a questão para o lado emocional. Fiquei imaginando as filhinhas do Maradona olhando prá minha cara com lágrimas nos olhos e dizendo que o “papá” nunca cheirou nada, que eu era um monstro nazista (e o pior é que tenho sangue alemão, mesmo). Enfim, eu não teria onde me segurar; não sou negro, nem pobre, nem deficiente físico, nem homossexual... Talvez só o fato de ser idoso contasse como atenuante para a minha falta de educação.
Resumindo, penso o seguinte; racismo nunca, violência nem pensar, mas zoação sempre. E fico muito preocupado com a ideia que se proponha um tipo de “código de ética” nos estádios; macaco não pode, veado não pode, filho da puta pode ser, cheirador talvez, corno quem sabe... É claro que isto não faz o menor sentido. Crianças, creiam na palavra deste velho peladeiro; a graça toda está em não ter regras, apenas o mínimo de bom-senso. E não tem nada mais bonito e humano do que você chegar para o ofendido, pedir desculpas e ele aceitar. É assim que o ser humano se engrandece.
Uma frase para terminar; “Agora falando sério; a seriedade é anti-humana. O nazismo, por exemplo, era sério paca”. O autor é o humorista Jaguar, do saudoso Pasquim. Tenho certeza que a neurose do politicamente correto é muito mais nazista do que a saudável zoação entre torcidas. E que atire a primeira pedra quem nunca xingou ninguém.

domingo, 20 de julho de 2014

E SE FOSSE A ARGENTINA?

A vitória dos alemães na Copa do Mundo mostrou, mais uma vez, aquilo que eu e todos os que entendem um mínimo que seja de gerenciamento de projetos já sabem há muito tempo; a importância do planejamento e da disciplina para que se atinja o sucesso. Não vou falar mais sobre o assunto, todos os meios de comunicação estão aí com reportagens, artigos, vídeos e mais o que seja para louvar a vitória alemã. O esporte como metáfora da vida, etc...
Chato como sempre, gostaria de levantar um pequeno problema; quem assistiu o jogo sabe que os alemães ganharam por 1x0, com um golzinho no final da prorrogação (golzinho é maldade minha; foi um golaço. A jogada foi muito bonita e a conclusão perfeita). Mas, independente da beleza do gol, foi só um a zero. E é preciso reconhecer que, durante os 120 minutos de partida, as melhores chances de marcar foram dos argentinos. Três vezes a bola do jogo esteve nos pés dos “hermanos”, mas as conclusões de Higuain, Palacios e Messi foram dignas de peladeiros da pior espécie, muito abaixo do talento reconhecido de qualquer um deles. O fantástico goleiro Neuer nem precisou usar sua categoria, os três chutes foram para fora.
Mas agora levanto minha tese; e se eles marcassem, e a Argentina fosse a grande campeã? Será que hoje diríamos que o modelo argentino deve ser imitado? Que dar calote na economia e estatizar o futebol é a grande solução? Para quem não sabe, o governo Kirchner tirou o campeonato de futebol das redes particulares de TV e hoje ele é uma ferramenta oficial de propaganda governista. Fiel ao espírito populista bolivariano, o próximo campeonato argentino terá trinta clubes e um regulamento complicadíssimo, visando evitar o rebaixamento dos grandes clubes. Enfim, quase quarenta anos depois eles estão repetindo a tática usada pelos governos ditatoriais do Brasil; onde a ARENA vai mal, entra um clube no nacional, era o que se dizia na época, referindo-se ao partido governista na pseudo-democracia que vivíamos então. Obviamente este modelo é perdedor; e não é a toa que os grandes clubes de lá, como Boca Juniors e River Plate, vivem hoje em situação muito pior do que os seus congêneres brasileiros, que nem são tão grande coisa assim.
Mas a seleção argentina, que não tem nada a ver com isto, porque todos os seus grandes jogadores jogam fora, mesmo, quase ganhou. Portanto, meus amigos, nunca esqueçam que o futebol pode ser uma metáfora para a vida, mas dentro de certos limites. O modelo alemão é o correto, e continuaria sendo mesmo que eles perdessem a final. Ainda bem que os deuses do futebol impediram a injustiça...

domingo, 6 de julho de 2014

De Maiakovski à vertebra do Neymar - causos de impunidade

“Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor de nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão.
E não dizemos nada.
Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.”
- Maiakovski, poeta Russo.
Por algum motivo, o lance que vitimou Neymar no jogo de anteontem me fez lembrar este poema. E me fez refletir sobre o problema da impunidade como fator cultural, algo que, infelizmente, é costume na sociedade brasileira. E também me lembrou outra frase, aquela que diz que de boas intenções o inferno está cheio.
Explicando; tudo começou quando a FIFA, pretendendo “preservar os artistas do espetáculo”, orientou os árbitros dos jogos das quartas de final a economizar nos cartões amarelos, para evitar alguma suspensão automática. O próprio Neymar se enquadrava no caso, porque já tinha um cartão, que levou no jogo de estreia, contra a Croácia. A intenção era ótima, mas a impressão que tenho é que a FIFA é hoje tão preocupada com os aspectos financeiros do seu megaevento que esqueceu completamente o que é um jogo de futebol. Apenas para lembra-los, o futebol pode ser um belo jogo, mas também tem o seu lado sujo – faltas, simulações, e otras cositas mas fazem parte do espetáculo e nem sempre são devidamente punidas.
Qualquer um que tenha participado de algum jogo com arbitragem oficial (mesmo que tenham sido apenas torneios amadores, como é o meu caso), sabe como a coisa funciona; o jogo começa meio morno, vai esquentando e, lá pelas tantas, alguém resolve “roubar a primeira flor do jardim”, para usar a linguagem do poeta russo. Em linguajar mais rasteiro, um dos jogadores resolve dar a primeira porrada, só prá ver o que o juiz faz. Se a reação é forte (cartão, bronca, punição), o jogo fica controlado; se os atletas percebem que o juiz está intimidado, por qualquer razão, o caos se instala rapidamente. E é claro que profissionais experientes como os envolvidos no jogo Brasil x Colômbia entenderam logo que só haveria punição em último caso (algo parecido com tentativa de homicídio). O resultado foram mais de cinquenta faltas em um jogo de noventa minutos, algumas dignas de boletim de ocorrência. De parte a parte, diga-se de passagem.
E aí, no finalzinho do jogo, o tal Zuniga, de cabeça quente porque o time dele estava perdendo, pegou o Neymar de jeito. Foi desleal? Sim, sem dúvida. É um crápula? Na minha visão, não. Fez apenas o que todo mundo estava fazendo; e quando diz que “foi uma fatalidade”, não me parece cínico, foi azar mesmo. Poderia haver uma perna quebrada tanto do lado de lá como de cá. Sobrou para a vértebra L3 do Neymar.
Resumo da ópera; para qualquer coisa funcionar direito – seja um jogo de futebol, uma equipe de projeto, uma sociedade, um país – é preciso haver um sistema de causa e consequências claro, e que seja aplicado com rigor. No momento em que se é conivente com o jogo sujo, mesmo que a causa aparentemente seja nobre, abre-se a caixa de Pandora, e libera-se todo o mal. E aí até o mais fraco deles se julga no direito de dar porrada, porque não vai acontecer nada, mesmo. Nem um cartãozinho amarelo.
Na verdade, talvez esta seja uma boa explicação para todos os problemas da sociedade brasileira, mas este “causo” fica prá próxima...

sábado, 28 de junho de 2014

O “CAUSO” DA MULTIPLICAÇÃO DE ALUNOS

Este causo ocorreu comigo em Juiz de Fora, há alguns anos. Era uma aula de “Gerenciamento da Comunicação em Projetos”, que fazia parte de um curso de MBA, e era ministrada em dois dias; sexta-feira à noite e sábado pela manhã. Ocorre que era o fim-de-semana do dia das Mães, e eu já me preparei para o fato que muitos alunos iriam faltar na aula de sábado, por conta de possíveis viagens.
Não deu outra; na aula de sexta-feira tivemos presença maciça, mas no sábado era possível notar claramente que o número de alunos era bem menor. Como passei um trabalho para ser feito na sala, pude verificar com exatidão o número de alunos presentes; vinte e dois (o total de alunos na turma era de mais ou menos quarenta). Ao final do trabalho houve um coffee break, aproveitei o intervalo para dar uma olhada na lista de chamada que eles haviam assinado e levei um susto; eram exatas 37 assinaturas! Ou seja; tínhamos quinze alunos-fantasmas na sala de aula.
Eu tinha poucos minutos para tomar uma decisão; deixar prá lá, dar uma chamada, ameaçar com punição, enfim, muita coisa me passou pela cabeça. Acabei achando uma solução que, sem modéstia, recomendo para todos os colegas que venham a passar por algo semelhante.
Fui até a secretaria e pedi uma cópia da lista de chamada. Quando os alunos voltaram para a sala, fechei a porta e falei, no tom mais sério que consegui;
- Pessoal, ocorreu um problema aqui na sala, mas, por mim, este assunto não vai passar daquela porta.
Senti que eles ficaram preocupados, peguei a lista de chamada na mão e continuei o teatrinho;
- Vocês acabaram de fazer o trabalho e assinaram. Eu tenho uma prova, fornecida por vocês mesmos, que existem 22 alunos nesta sala. E esta lista tem 37 assinaturas.
O silêncio na sala era completo. Daria prá ouvir o zumbido de um mosquito. Peguei um copo com um restinho de água dentro, e dei o golpe final;
- Fui à secretaria e contei que, acidentalmente, eu derramei água em cima da lista assinada por vocês, e ela ficou inutilizada (neste ponto, joguei a água na lista assinada, rasguei-a e coloquei no lixo). Pedi desculpas pelo incômodo, eles me deram esta lista nova e eu solicito a vocês que façam o favor de assinar novamente. Se esta lista voltar com 22 assinaturas, o caso acaba aqui. Se voltar com mais de 22, vou ter que tomar outras providências. Depende só de vocês. Fui claro?
Não preciso contar que a lista voltou exatamente com 22 assinaturas, e ninguém saiu chateado. Lição aprendida; todo aluno, no fundo, é uma criança. E brigar com criança é besteira, o negócio é ensinar. E ser criativo, sempre.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

O DIA EM QUE RECEBI UM RECADO DE DEUS

Embora seja um sujeito extremamente crítico, ácido e irônico por natureza, também tenho o direito a um momento de pureza tipo “encontrei Jesus”, ou algo assim. Este “causo” aconteceu quando fui dar uma aula em Fortaleza, há uns sete ou oito anos, mais ou menos. Cheguei lá numa sexta-feira, para ministrar um curso que ocuparia o sábado todo e boa parte do domingo. É claro que uma viagem destas não é exatamente de lazer, mas mesmo assim sempre se arruma um tempinho para dar uma caminhada pela beira da praia, comer um bom pastel de camarão, enfim, desfrutar destes pequenos prazeres que tornam a vida mais agradável.
O curso era no próprio hotel, o que é ótimo, porque economiza o tempo para deslocamentos e, quase sempre, é possível subir ao quarto e dar uma descansada no intervalo de almoço. Chegando ao local, desanimei um pouco; ficava lá pros lados da Lubnor (quem conhece Fortaleza sabe que ali não é o melhor pedaço da orla). Daí prá frente, só decepções; quarto precisando de uma boa faxina, ar condicionado barulhento, problemas com a água quente do chuveiro... Pior ainda; o hotel era vizinho de uma espécie de vila de pescadores cuja gente, vista na luz difusa do entardecer, me pareceu ameaçadora e mal-encarada. Abandonando a idéia da caminhada noturna pela orla e do jantar fora, pedi comida do próprio hotel. Só que não era mesmo o meu dia; o filé de frango esturricado, acompanhado de uma massa grudenta, só fez piorar o meu humor (e olha que não sou do tipo que reclama de comida). As más notícias continuaram quando resolvi inspecionar o “Salão de Convenções”, onde aconteceria o curso; a iluminação era péssima, as cadeiras desconfortáveis, o som não funcionou... Para completar meu dia de cão, o pessoal da organização do curso não apareceu e nem deu notícias.
Fui dormir maldizendo a vida, e jurando que nunca mais ia entrar em outra fria destas. Tive pesadelos com o curso, com a sala, com a avaliação dos alunos... Como sou madrugador por natureza, acordei bem antes do início do horário de café da manhã do hotel e fiquei remoendo meu mau humor (que, com a fome, ficou muito pior, é claro). De repente, um barulho ao longe, parecendo fogos de artifício, me deixou curioso. Eu não sabia, mas ia começar uma das maiores lições que recebi na vida.
Sonolento e rabugento, fiquei algum tempo parado na varanda tentando acostumar os olhos à claridade da manhã cearense. Quando finalmente consegui enxergar direito, o espetáculo que se ofereceu foi de uma beleza rara; num mar azul claro, diversos barquinhos e jangadas seguiam um barco um pouco maior, enfeitado com bandeirinhas, que carregava o que parecia ser a imagem de uma santa. Os fogos vinham dali. E a melhor parte veio quando olhei para a praia; aqueles caras que na noite anterior me pareciam estranhos e agressivos estavam lá, acompanhados das mulheres e filhos, todos vestindo suas melhores roupinhas, embarcando sorridentes para se juntarem à procissão.
A “viagem” que aconteceu comigo a seguir eu nunca consegui entender, e é ate difícil de contar. A visão das jangadas no mar começou a ser embalada por uma canção de Dorival Caymmi, que não sei se era cantada pelo pessoal ou se vinha do meu próprio delírio; “Minha jangada vai sair pro mar, vou trabalhar, meu bem querer”... Senti a recordação agradável que esta música sempre me trouxe, de um passeio com a minha turma do colégio na praia de Atlântida, lá pelos meus quinze anos de idade (esclarecimento importante; esta Atlântida fica no litoral gaúcho, não é o continente perdido. Minha viagem não foi tão louca assim). Ato contínuo, desandei a chorar. E foi então que ouvi, claramente, a divina mensagem; “Ta reclamando de que? Você veio aqui trabalhar, está sendo muito bem pago, e vai ficar de frescura porque a comidinha não está boa, porque a água está fria? Olha prá esta turma aí embaixo! Não sabem o que é ar condicionado, não ganham metade do teu salário, e ninguém ta com esta cara de babaca! Entendeu, sua bichinha mimada? Faz o teu trabalho direito e pára de reclamar, porra!”. Sem dúvida, era o meu mentor espiritual; afinal, um cara que nem eu jamais mereceria um mentor bonzinho, muito menos politicamente correto. O sacana estava me dando um esporro, o recado que ele trazia de Deus era curto e grosso, exatamente o que eu precisava ouvir naquela hora. Afinal, todo mundo sabe que Ele não erra.
Meu transe durou uns quinze minutos. Eu olhava a cena, chorava e me xingava, olhava de novo, chorava mais ainda e me xingava em dobro. Quando finalmente consegui readquirir um mínimo de autocontrole, o hotel, a vida e o mundo não eram mais os mesmos. Ainda citando o mestre Caymmi, a jangada voltou só; o sujeito insuportavelmente chato e reclamão que chegara naquela varanda minutos antes, afundou no oceano e foi despedaçado por tubarões (que devem ter tido uma baita diarréia depois). O novo “eu” voltou para o quarto, lavou o rosto e desceu para tomar café com a alma pacificada e feliz. Não me perguntem como, nem porque; só sei que foi assim, diria o impagável personagem mentiroso representado por Selton Mello no filme “O Auto da Compadecida”.
Nem preciso dizer que, dali em diante, tudo deu certo. Logo apareceu no hotel um anjo chamado Andréia, enviado pela organização do curso (e pelos céus, tenho certeza) que, com aquela doce simpatia das nordestinas, arrumou soluções para todos os problemas da sala; as aulas transcorreram bem, a turma era ótima. E o toque divino se estendeu até os cozinheiros do hotel, que acertaram a mão e fizeram um almoço elogiado por todos nós.
Domingo, antes de embarcar de volta para casa, fui me despedir da varanda que serviu de cenário para o meu pequeno milagre. E o verso que me veio à cabeça desta vez foi de Renato Teixeira, nosso querido caipira-Pirapora-Nossa Senhora de Aparecida; “cada um de nós compõe a sua história, e cada ser em si carrega o dom de ser capaz... E ser feliz”.
Tenho certeza que meu mentor estava satisfeito. Ele, com o auxílio dos poetas, estes grandes mensageiros de Deus, cumprira com louvor a sua missão; fazer com que este discípulo imbecil entendesse que ser feliz é uma opção, quase uma obrigação, no meu caso. Captei vossa mensagem, divino Mestre! E posso dizer que “hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe, e só levo a certeza de que muito pouco eu sei... Eu nada sei”.
Amém.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Da série "meus pitacos no linkedin" - o causo da Curva S

Mais uma vez me meti nas intermináveis (e saudáveis) discussões no grupo de gerenciamento de projetos do LinkedIn.
O assunto era a importância da curva S e do gráfico de Gantt para o acompanhamento do projeto. A discussão estava, mais uma vez, dividida entre os fãs das ferramentas e os "cascudos", que acham que gerenciar é muito mais que isto. Para não deixar dúvidas sobre o meu lado na briga, entrei logo com o pé por cima da bola, e tasquei lá;
- Esta discussão toda me lembrou um “causo” que aconteceu comigo há uns dez anos, mais ou menos. Um aluno metido a espertinho me fez a seguinte pergunta;
- “Mestre, na Petrobras vocês gerenciam projetos com MSProject?”
Eu lembro que estava muito mal humorado neste dia (acho que, na véspera, o Grêmio tinha perdido um jogo importante), e respondi na lata;
- “Não, a gente usa o cérebro!”.
É claro que imediatamente pedi desculpas pela grossura, mas o fato é que esta confusão que algumas pessoas fazem entre “ferramentas” e “gerenciamento de projetos” tem o dom de despertar o pior do meu mau humor.
Vemos isto todo dia até aqui no LinkedIn; poucas pessoas se habilitam a participar de discussões realmente relevantes, mas é só falar em “template” que aparece logo um monte de interessados. Infelizmente, tem muita gente boa que acredita que para ser um bom gerente de projetos o sujeito só precisa decorar o PMBoK e conhecer um monte de templates e aplicativos.
Falei tudo isto para dizer que o grande problema é achar que a curva S e o gráfico de Gantt vão resolver o seu problema de planejamento e monitoração do projeto. Sem chegar ao radicalismo do Finocchio (prá quem não conhece; Prof. José Finocchio, da FGV, uma das maiores autoridades brasileiras na área de GP), que diz que “são ilusões”, eu diria que são “imagens” que, de alguma forma, te ajudam a ter uma ideia de como está o projeto; mas a vida real, sem dúvida, é muito mais que isto.
Finalizando, e falando em futebol, como de hábito, eu diria que a curva S é como uma imagem do jogo na TV; por mais que a técnica evolua, e hoje a gente tenha HD, 3D, Realidade Virtual e o escambau, a verdadeira realidade do jogo só sabe quem está dentro do campo, sentindo a chuva, o sol, o vento, a grama, a batida da bola, a pressão da torcida, etc... Não existe ferramenta, nem template, nem software que passe isto para o espectador; então o jeito é mostrar as imagens.
Resumindo, ferramentas servem para te ajudar; mas quem ganha ou perde o jogo é quem está dentro do campo. E é aí que a vida começa a ficar complicada...
Abraços e sucesso para todos.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

MANIFESTO DOS GERENTES DE PROJETOS DO BRASIL

Podemos dizer, sem medo de errar, que nenhuma área de conhecimento cresceu tanto no Brasil no século XXI quanto a de gerenciamento de projetos. Qualquer que seja o critério de medição (número de profissionais certificados, cursos de MBA, chapters do PMI, etc...), podemos ver que houve uma verdadeira explosão entre 2001 e a data atual. E, no entanto, qual foi o resultado prático disto? Nossos projetos estão tendo sucesso? Os cronogramas, escopos e orçamentos estão sendo cumpridos à risca? Acho que a resposta óbvia é NÃO, assim, em letras maiúsculas.
Agora tenho a impressão que chegamos ao fundo do poço; o Comitê Olímpico Internacional nomeou uma espécie de interventor estrangeiro para garantir que os projetos da Rio-2016 sejam devidamente monitorados e controlados.
Não sei se os colegas entenderam a gravidade da situação; na prática, isto significa que eles entenderam que não existe, no Brasil, gente capacitada para exercer a função. Tiveram motivos para isto? Não podemos dizer que não. É só olhar a vergonha que estamos passando com os projetos dos estádios, dos aeroportos, das refinarias, enfim, parece que nada funciona no Brasil. Assim, a última coisa que precisamos, neste momento, é partir para a xenofobia histérica e dizer que nós é que estamos certos e que eles não entendem o Brasil. Quando o secretário da FIFA disse, há mais de um ano atrás, que estávamos merecendo um “kick in the ass” ele estava prá lá de certo. O tempo é o senhor da razão.
Assim sendo, acho que está na hora de nós, que militamos na área de gerenciamento de projetos, tomarmos uma atitude séria. Não, nem pensem que vou sugerir passeatas e quebra-quebra, não é a nossa especialidade. Acho que temos inteligência e capacidade para propor uma atitude muito mais construtiva que isto. A ideia seria tentar divulgar, em todos os meios de comunicação possíveis (redes sociais, blogs, portais, jornais, etc...), um manifesto de poucas linhas, cujo texto básico seria algo do tipo;

“Nós, profissionais brasileiros que trabalhamos na área de gerenciamento de projetos, temos certeza que existe no País conhecimento e capacidade mais do que suficiente para fazer com que os nossos projetos tenham um desempenho muito melhor que o que temos hoje. Neste momento a imagem do Brasil nesta área é a pior possível, e entendemos que isto atinge a todos nós, independente de simpatias partidárias ou ideológicas; trata-se de defender os interesses da nação brasileira, seja qual for a agremiação política que ocupe o poder executivo neste momento.
A proposta que temos é simples, e obedece aos princípios mais básicos de gerenciamento de projetos. Usaríamos a Olimpíada-2016 como projeto-teste; depois, em caso de sucesso, a proposta seria estendida a outros grandes projetos. Os pontos básicos são;
a) Que sejam disponibilizadas, em um site da internet com livre acesso, os seguintes documentos referentes aos diversos projetos que integram o mega-projeto Olimpíada-2016;
- Definição do escopo e entregas principais
- Cronograma detalhado;
- Custo previsto e curvas de desembolso;
- Matriz de responsabilidades (quem é o responsável por cada etapa, o que depende da área pública e o que depende da empreiteira, etc...);
- Principais riscos identificados.
b) Que estas informações sejam atualizadas com uma periodicidade nunca superior a dois meses.
c) Que todas as mudanças significativas do projeto sejam acompanhadas de um relatório que as justifique (informando ainda quem propôs, quem aprovou, etc...).”

Pessoal; qualquer um que conheça um pouquinho que seja de gerenciamento de projetos sabe que estas são informações básicas, sem as quais ninguém consegue planejar, executar e controlar um projeto. E entendo que o acesso a estas informações é um direito mínimo de quem trabalha e paga seus impostos. Eu procurei isto em diversos lugares e não achei, e tenho razões sérias para acreditar que não estejam disponíveis; se não fosse assim o COI não teria tomado atitude tão radical.

quarta-feira, 19 de março de 2014

O “CAUSO” DA HERANÇA DO TIO CHICO E O LEILÃO DE LIBRA

Tenho fama (justa, por sinal), de contador de “causos”. A explicação é simples; desde que comecei no ofício de dar aulas, entendi que a forma mais fácil e atraente para fazer com que os alunos entendam um conceito é inventar uma história simples, que mostre a sua aplicação na prática. E o gerenciamento de projetos, área onde atuo, permite o uso desta técnica constantemente.
Pensei no assunto quando ouvi diversos grupos influentes na opinião pública se referindo ao leilão de Libra como “entrega das riquezas brasileiras”. Esta afirmação, que se baseia em um nacionalismo que pode até ser sincero, não resiste à mais primária análise de riscos. E a melhor forma de explicar isto é através de um “causo”.
Vamos supor que você tem um tio meio extravagante, aquele tipo que nunca se casou nem teve filhos, mas tem muito dinheiro. Vamos chamá-lo de Tio Chico, como aquele personagem da família Adams. Um belo dia você recebe a notícia que o tio Chico morreu, e você é um dos herdeiros. E aqui vamos criar dois casos (cenários), que serão úteis para o entendimento da proposta.
No primeiro caso, o bom tio Chico te deixou um apartamento no Leblon, avaliado em dois milhões de reais. E o advogado dele já avisa; olha, se você não quiser se preocupar com transferência de propriedade, taxas e outras coisas, tem um cara aqui que gosta tanto do imóvel que compra, à vista, hoje mesmo. Resumo; você acaba de ganhar dois milhões de reais sem fazer a menor força. Grande tio Chico!
No segundo cenário, a herança é uma fazenda nos confins do Mato Grosso. O valor avaliado é o mesmo; dois milhões de reais. Só que, para tomar posse, você vai ter que ir até lá para registrar no cartório local, são dois dias de viagem por estradas horríveis, que ficam inundadas durante boa parte do ano, há boatos que parte da fazenda foi ocupada por sem-terra, na área existem casos de malária e febre amarela, enfim, as dificuldades são imensas. E, assim como no primeiro caso, existe um cara que quer comprar a propriedade agora mesmo, à vista. Ele vai pagar os dois milhões? Claro que não. Talvez te dê um milhão, um e duzentos, mas o certo é que ele vai querer um deságio, porque os riscos envolvidos no negócio são maiores. Simples assim.
O pré-sal é mais ou menos como a fazenda; vale muito, mas vai demandar custos, recursos e tempo para começar a dar lucro. E os riscos envolvidos não são desprezíveis. Numa análise muito preliminar e simplificada, podemos apontar logo duas grandes fontes de riscos para este projeto (existem outras, é claro);
a) Riscos técnicos; por maior que seja o conhecimento acumulado pela Petrobras sobre a tecnologia envolvida nesta exploração, o fato é que ninguém pode jurar que vai dar tudo certo, pela simples razão que nunca foi feito nada parecido no mundo. Não custa lembrar que, para viabilizar o empreendimento, as plataformas terão que produzir durante muitos anos. Como se comportarão os equipamentos, as colunas de produção e o próprio reservatório ao longo de dez ou quinze anos de produção? Até onde sei, ainda existem alguns pontos de dúvida, principalmente em função do ineditismo deste tipo de produção.
b) Riscos econômicos; a produção só vai atingir o seu ponto máximo daqui a uns dez anos, mais ou menos. Quem pode garantir que os preços do petróleo estarão no mesmo patamar de hoje? E a demanda?
O que queremos dizer é que, embora a perspectiva de ganho seja muito boa, as incertezas são grandes, e os custos envolvidos imensos. Num cenário destes, manda a boa prática que se procure parceiros (a estratégia é conhecida como “dividir o risco e compartilhar a oportunidade”). E é esta a proposta destes contratos; dividir os custos e, obviamente, os lucros, caso venham. Quem afirma que “esta riqueza pertence ao povo brasileiro” esquece (ou omite propositalmente, o que é pior) a segunda parte da frase; “se alguma coisa der errado, o prejuízo também pertence ao povo brasileiro”. Levando-se em conta que estamos falando em bilhões de dólares, e que o nível de incerteza ainda é alto, será que o tal de “povo brasileiro” iria querer encarar uma destas, se estivesse bem informado sobre o assunto?
Resumindo, é muito fácil dizer meias-verdades e jogar com o emocional das pessoas. Difícil é conduzir o processo de forma isenta e tomar a melhor decisão. A exploração do pré-sal pode ser o passaporte para o Brasil entrar no primeiro mundo. Mas para chegarmos lá teremos que ter disciplina, disposição de trabalhar e, principalmente, de respeitar os contratos assinados. Manifestações violentas, xenofobia histérica e guerras de liminares seguramente não vão ajudar em nada. Enfim, mais uma vez o futuro do Brasil está em nossas mãos. Que Deus nos ilumine para que tomemos as ações corretas.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Será que ninguém mais sabe fazer letra de música? (primeiro de uma série que promete ser longa)

Começando o ano, depois da visita indefectível de don Calavera (ver post anterior), este blog vai utilizar de sua imensa repercussão nacional e internacional para levantar uma bandeira; porque não se faz mais poesia como antigamente?
Conheço algumas teorias de mesa de bar que tentam buscar uma explicação, mas o fato é que a penca de grandes letristas que sempre foram a característica maior da boa MPB ou já morreu ou passou dos sessenta anos. E, como se sabe, a poesia e o humor fino são características exclusivas da raça humana, e ajudam a nos diferenciar dos chamados "animais irracionais" (denominação que, diga-se de passagem, nem sempre é muito justa. Vejam o comportamento das tais "torcidas organizadas" para comprovar que tenho uma boa dose de razão).
Mas, sem mais delongas, vamos ao primeiro vídeo de uam série que pretendemos que seja longa. Infelizmente, pouca gente sabe quem é Paulo Cesar Pinheiro (em compensação, Anitta e Michel Teló... pois é). Prá quem não sabe, compartilho este ótimo vídeo em que ele conta como compôs, com apenas 14 anos de idade, uma das maiores pérolas da história da MPB; Viagem. Obviamente que a música é cantada no final do vídeo.
O endereço é http://www.youtube.com/watch?v=QiX1_JObgqw.html. Se o link não funcionar, é só copiar e colar na barra de endereços que vai. E vale a pena, podem ficar certos.
Prometo que tem uma longa lista de "desconhecidos" vindo por aí; Luiz Vieira, Renato Teixeira, Vitor Martins... além dos conhecidos Chico Buarque, Vinícius, e outros.
Até a próxima!

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

2014 segundo don Calavera

Conforme sabem todos os que frequentam este blog (e que nem são tantos assim...), tenho um guru espiritual chamado don Calavera, um nobre espanhol da Idade Média (pelo menos é o que ele diz, pode ser tudo mentira). Todo ano nos encontramos em um sonho, e ele me passa suas dicas de ano novo (ver posts http://www.causosdoherve.blogspot.com.br/2012/01/previsoes-mal-humoradas-para-2012.html e http://www.causosdoherve.blogspot.com.br/2013/01/a-volta-triunfal-de-don-calavera.html). Só que, como todo o bom espanhol, don Calavera tem sangue caliente, e de vez em quando aparece de surpresa, sem avisar (ver post http://www.causosdoherve.blogspot.com.br/2013/04/don-calavera-ataca-outra-vez.html). O fato é que o índice de acertos dele é bem significativo, e confesso que estava ansioso para nosso encontro deste ano. E ele apareceu exatamente no dia primeiro de janeiro.
Devo dizer que custei a reconhecer meu guru, embora o cenário fosse o mesmo de sempre; a taverna, as taças e o vinho estavam lá. Mas ao invés da agitação habitual, don Calavera apresentava uma expressão taciturna (vai lá no dicionário e descobre o que é isto), e começou a falar de forma educada e calma, o que nunca foi o estilo dele;
- Hola, como estas?
Cheguei a pensar que ele estava doente, mas logo lembrei que trata-se de um espírito desencarnado há séculos, portanto a hipótese era ridícula. Tentei provocá-lo;
- Estoy bien, don Calavera. Mas que cara é esta? Pensei em te encontrar animadíssimo com a perspectiva de assistir aos shows da dupla Neymar e Messi, no Camp Nou (para quem não sabe, don Calavera viveu na Catalunha e é torcedor fanático do Barcelona).
- Porque no te callas? Mira, estoy de saco cheio com ustedes. E este ano no voy a fazer previsão nenhuma; está tudo na mão de vocês.
- Como assim, don Calavera?
- 2013 foi el año em que ustedes, brasileños, tiveram el mejor e el peor que puede suceder a um País. El mejor; pela primeira vez em la história um grupo de políticos bandidos foi condenado e preso, não como políticos, pero como bandidos. Cierto?
Fiz que sim com a cabeça. Nem quis abrir a boca, para não atrapalhar o raciocínio dele.
- E o que eles alegam agora? Que no son bandidos, pero si vítimas de perseguição política! E o que hacen las autoridades (incluindo a presidente da República)? Assinam embaixo! Em otras palabras; la mejor decisión del Judiciário brasileño em 500 anos de história é desqualificada pelos líderes do Executivo e do Legislativo! Casi gera uma crise institucional!
- Entendi, don Calavera. E o que foi o pior?
- Em 2013 ustedes tuvieran el aperitivo de la Copa del Mondo; la Copa de las Confederaciones. E o que los desmiolados brasileños fizeram? Trataram bem os turistas, fizeram todo o possível para que os jogos transcorressem em paz y harmonia? No! Resolveram protestar e fazer bagunça! Até mesmo o tal don Blatter, el mafioso suíço, sacaneou vocês, disse que não entendia, que o Brasil mesmo é que tinha pedido para sediar la Copa... E o que resultou destas manifestações idiotas? Nada! Até mesmo los políticos que estavam com avaliação baixa na época, já retomaram todo su prestígio, e dona Dilma es favorita a la reeleição...
- Resumindo, estás dizendo que resolvemos mostrar consciência política na hora errada, de forma errada e para as pessoas erradas...
- Fenômeno! Finalmente entendeste alguna cosa!
Mesmo de baixo astral, a marra dele continuava insuportável.
Mas ele queria mesmo era dar o recado final;
- Mira, se ustedes querem, realmente, melhorar este País a partir de 2014, a receita é simples; façam a melhor Copa de todos los tempos, e deixem para fazer manifestações políticas depois da Copa, na preparação para as eleições. Na hora do esporte, esporte; na hora da política, política. Simples asi. E não caiam nesta conversa mole de que el julgamento es político... bandidos son bandidos, seja qual for o partido!
Sentindo que ele estava indo embora, resolvi fazer mais uma provocação futebolística;
- E, afinal, quem vai ganhar a Copa?
- Espanha, é claro! (nesta hora o torcedor falou mais alto que o guru, tenho certeza). No penses que vamos dar outra colher de chá para vocês, como fizemos na Copa das Confederaciones. Se bem que este tal Felipão es terrible... Tomara que seja el nuevo treinador de Barça! Seremos invencíveis!
E foi com esta nova animação que don Calavera saiu apressado, deixando a conta para mim, como sempre. Tenho que confessar que, este ano, suas previsões me pareceram mais sábias do que nunca...
Hasta la vista, don Calavera!